Fonte: UAI (clique aqui)
O músico diamantinense embarca para o país para estudar na reconhecida Accademia Nazionale di Santa Cecilia
A intuição e o devaneio têm papéis fundamentais no processo de composição musical, mas o trabalho de escrita é meticuloso e racional, explica Sergio Rodrigo Ribeiro Lacerda. O jovem compositor de 31 anos será alvo de apoio e homenagem de amigos e parceiros hoje à noite, na Fundação de Educação Artística (FEA). No local, será realizado o concerto 'Piano piano si va lontano', que, além de marcar a despedida dele da cidade, pretende levantar recursos para a viagem que o músico vai realizar em janeiro.
Traduzido do italiano, o título da peça, 'Pouco a pouco se vai longe', tem tudo a ver com a trajetória do compositor diamantinense, que afivela as malas para embarcar para a Itália, onde será o primeirobrasileiro a cursar programa de composição musical na Accademia Nazionale di Santa Cecilia. Com três anos de duração, o curso de uma das instituições musicais mais antigas do mundo, sob orientação do maestro Ivan Fedel – diretor musical da Bienal de Veneza , equivale a um doutorado.
“Mas é um diploma artístico, não acadêmico”, ressalta Sergio Rodrigo, que, depois de ter partituras, gravações e portfólio avaliados, foi submetido a sabatina de uma hora de duração, na qual sagrou-se vencedor ao lado de outros dois candidatos. O ano atípico (Copa do Mundo seguida de eleições) e a ausência de editais públicos nesse período acabaram emperrando a viagem do compositor, que conta agora com a colaboração pública para embarcar.
Graduado pela Escola de Música da UFMG, onde fez mestrado em Processos Analíticos e Criativos (PAC), Sergio coordena o programa Composição em Foco, realizado mensalmente na Fundação de Educação Artística. Ele chegou a Belo Horizonte aos 14 anos, vindo de Diamantina, no Vale do Jequitinhonha. Filho de mãe pianista que sempre o incentivou na música, ele nem sequer lia quando ganhou um violão.
“Como tinha piano em casa e no conservatório de música que minha mãe dirigia na cidade, provavelmente ficava batucando no instrumento”, tenta lembrar o compositor. Do conservatório para a escola infantojuvenil de música criada pela mãe, com metodologia mais prática de ensino, quando se deu conta Sergio Rodrigo já participava de serenatas e eventos afins de uma cidade reconhecida pela tradição musical.
Antes de chegar à capital, ele conheceu o compositor argentino Rufo Herrera, aqui radicado, com o quem fez oficina de criação musical que seria decisiva em sua formação. “Ele me orientou a me matricular na FEA, onde fui estudar música de maneira mais formal pela primeira vez”. Além de violão, com Teodomiro Gular, Sergio Rodrigo passou a estudar também piano com Moacir Laterza Filho. “Foi importante a oportunidade de abrir o leque, entrar na música de maneira profunda, por meio de um repertório moderno e contemporâneo, que ainda desconhecia”, recorda o compositor, cuja formação em Diamantina foi à base de música popular.
“Ainda jovem, assistia a todos os concertos, abria os ouvidos para todo tipo de música”, lembra ele, que, incentivado por algumas disciplinas da fundação, já “brincava” de compor. Em 2002, Sergio Rodrigo participou do 4º Encontro de Compositores e Intérpretes Latino-americanos, na FEA, quando, além de concertos, participou de palestras e oficinas ministradas por autores de todo o continente. Paralelamente, ele também participou dos tradicionais festivais de inverno realizados em Minas Gerais, em particular o da UFMG, que, por alguns anos, foi realizado em Diamantina.
Em uma das edições do evento, Sergio Rodrigo conheceu o boliviano Edgar Alandia, professor do Conservatório de Perugia, que lhe falou da Accademia Nazionale di Santa Cecilia, além de Silvio Ferraz, da Universidade de São Paulo (USP), ambos fundamentais para a escolha da carreira de compositor. Com cerca de 20 peças para diversas formações (orquestra, orquestra de câmara, quarteto de violões, violão solo, piano solo e até para narradores, quando utiliza textos declamados), Sergio Rodrigo começou a compor em 2009.
“Minha música está caminhando para um lugar que é a busca de uma conexão entre o popular e o erudito, que são as áreas nas quais tenho mais prática, com algumas imagens poéticas que têm a ver com a natureza brasileira”, explica o jovem compositor. Premiado no concurso Tinta Fresca, criado pela Orquestra Filarmônica de Minas Gerais (OFMG) para incentivar a composição sinfônica, ele já teve duas peças executadas pela OFMG.
“Em alguns momentos é a realidade fluida, que evoca a água; em outros é algo pulsante, rítmico, que remete ao popular”, explica ele sobre suas obras. O compositor diz ter aprendido com Silvio Ferraz a relativizar o rigor dentro da escrita das peças. “Ele me ajudou a trazer elementos da minha vivência para a composição, mostrando que a criação tem um lado mais leve”, acrescenta.
Ao falar de seu processo de trabalho, ele revela ainda que tenta transmitir a sensação de movimento por meio de sua música. “De maneira plástica, fluida e até pulsante”, diz Sergio Rodrigo, que se declara atraído pela qualidade dos movimentos – da água e do vento na areia. “É a partir da minha fantasia para o som dos instrumentos que eles vêm”, esclarece.
Hendrix e missa De grupos de choro aos de samba, passando por banda cover de Jimi Hendrix, o compositor já participou em variadas formações, além de tocar em casamentos, missas e carnaval. Também dá aulas de musicalização, apreciação musical, história da música e composição na Fundação de Educação Artística há pelo menos uma década. Além do Tinta Fresca, o compositor já ganhou por duas vezes o prêmio Camargo Guarnieri, do Festival de Inverno de Campos do Jordão (SP), e o prêmio de composição da Académie de Musique et de Dance Domaine Forget, no Canadá.
Entre os intérpretes e colaboradores de sua música estão o Ensemble Intercontemporain, Filarmônica da Rádio France, Exaudi Vocal Ensemble, Nouvel Ensemble Moderne, Camerata Aberta, Oficina Música Viva, Quarteto Corda Nova, Duo Qattus, os pianistas Luiz Gustavo Carvalho, Ana Cláudia Assis e Alice Belém, além da OFMG.
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