Um jornalista alemão, Marc Fischer, intrigado pela figura de João Gilberto --misto de fascínio pelo artista e de amor e ódio pelo homem que não sai de casa, não se deixa ver e não fala com ninguém, mas hipnotiza as pessoas à distância--, acaba de produzir um livro apaixonante: "Ho-ba-la-lá - À Procura de João Gilberto".
Algum brasileiro escreveria livro igual? Não é o nosso jeito --somos muito solares. Quem mais faria do inventor da bossa nova o personagem de um "roman noir" composto de fatos reais, com especulações (surpreendentemente a propósito) sobre a morte, o destino, a solidão, a fala por silêncios e a sensibilidade para com o invisível?
Quem mais mostraria João Gilberto como um sonhador, um iogue, uma jiboia, um mutilado de guerra, um vampiro ou um homem que, 10 horas por dia, cria obras-primas para as paredes? Um homem onipresente no coração e mente das pessoas que o cercam, muitas das quais não o veem há dez anos --ou nunca o viram. E que representa o perigo --há quem tema se apaixonar ou se deixar escravizar se se aproximar dele.
A narrativa não para, nem quando o autor faz reflexões. Como na sua ida a Diamantina (MG), onde, nos anos 50, João Gilberto, no banheiro da casa da irmã, inventou a batida de violão da bossa nova, tocando, entre outras, "Ho-ba-la-lá".
Fischer penetra na casa (hoje, uma imobiliária), tranca-se no banheiro e conclui que, nos seus humildes 5 metros quadrados, este só comportaria um homem e um violão se o sujeito estivesse sentado no vaso. Testa (com seu próprio "Ho-ba-la-lá") a sonoridade do violão nos ladrilhos e azulejos ("Os canos se lembram de quem lavou as mãos em sua água?"). E admite que os cristais que Otávio Terceiro afirma existirem debaixo da casa podem ter contribuído para a pureza do som de João Gilberto.
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