Entre o “Sapo Seco” e os perus deslumbrados
Texto: Saul Moreira, no Micuim.Org. (Fevereiro/2008)
Por esses dias li no “Voz” sobre o pré-carnaval em Curralinho. Até Banda do Sapo Seco tinha. Que coisa mais gostosa. E com feijoada. Claro que fiquei me lembrando de coisas da infância, quando Extração era longe pra burro do “Comércio”. Duas léguas – o suficiente pra que eu enjoasse sempre nos carros-de-praça.
Das férias lá, das jabuticabas, da primeira música que, pra desgosto de meu pai, aprendi com tio Antônio a acompanhar ao violão – “Noite do Meu Bem”, da Dolores Duran −; do frio, dos carrapatinhos em julho, às centenas; dos colchões de palha barulhentos, do cheirinho aconchegante de macela-do-campo no travesseiro; do macarrão goela-de-pato de tia Mariquinha; da binga de algodão e cristais, pra fazer a faísca, do tio Zé Botelho. O cheiro dos cigarros de palha. Da “jardineira” de Carlos Bruce, do Chevrolet verde mais lustroso da paróquia, o de Zuzu, com seus óculos Ray-Ban. E do tio Biron, da tia Efigênia, do Pantalão…
Mais tarde, os molhos-pardos encomendados por Renê no carnaval. Na segunda-feira, principalmente, em que não havia Sapo-Seco e o Xai-Xai ainda não tinha sido gloriosamente inventado. Era um remanso. As vozes já roucas de “tanto riso, tanta alegria…” insistindo, depois de umas tantas pingas, em cantar Vandré em tom de macho subversivo: “Quem é homem vai comigo; quem é mulher fica e chora; tô aqui quase contente, mas agora vou-me embora…” E mais: “O terreiro lá de casa não se varre com vassoura: varre com ponta de sabre, bala de metralhadora…”
Claro, Chico Buarque também presente, com “Carolina”, “Januária”, “Quem te viu, quem te vê”, “Apesar de Você”… E a “Noite dos Mascarados”, em que as meninas paqueráveis adoravam fazer, com o máximo de dengo, o contracanto: “-Eu sou seresteiro, poeta e cantor… –O meu tempo inteiro, só zombo do amor… –Eu tenho um pandeiro… –Só quero violão… –Eu nado em dinheiro… –Não tenho um tostão…” E todo mundo: “Mas é carnaval, não me diga mais quem é você. Amanhã tudo volta ao normal… Seja você quem for, seja o que Deus quiser…”
Pô, Quincas, você precisava estragar tudo? Meter no artigo aqueles carros duelando estupidez pseudomusical em pleno Curralinho? Aqueles descomunais decibéis revelando as enormes carências afetivas, e sei lá quantas mais, dos idiotas proprietários a “estuprar” os tímpanos de todo mundo? E sabe o que é pior? Essa praga é endêmica: já não a suportei em Mendanha e em Rio Manso; recentemente, em Conceição do Mato Dentro e, acredite, até aí em Diamantina, juro! Mas nem acho que seja mais caso de polícia, não, deixe que ela cuide dos lamentáveis esfaqueadores… No caso dos perus deslumbrados com seus potentes sons, já tô achando que tá faltando é macho pra acabar de vez com isso. Ou a turma abaixa o volume ou “madeira de dar em doido vai descer até quebrar…” Ah, e você já ouviu num desses violadores sonoros alguma música pelo menos razoável? É sempre um baticum insuportável, já não bastasse a tamanha estatura do ego daqueles infelizes, “crentes que estão abafando”…
Ah, Curralinho, escute o Quincas, não deixe acontecer isso aí, não! Fique com o “Sapo Seco” e com as lembranças de Fabiano Pimenta cantando Noel Rosa nas tardes de segunda-feira de carnaval. E engorde galinhas pros molhos-pardos!
Êh vontade!!! Abço.
ResponderExcluirE claro que me vêm lembranças: http://www.micuim.org/?p=1427.
ResponderExcluirEspero que os "sonzãos" não apareçam mais lá...