Renato Fonseca – Jornal Hoje em Dia - 3/04/2011
História, arte e cultura de portas fechadas. A falta de segurança e o número restrito de funcionários impedem turistas brasileiros e estrangeiros de conhecer melhor o patrimônio de Minas. Menos da metade dos museus do Estado abre nos fins de semana, aponta levantamento feito em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). A maioria funciona de terça a sexta-feira, somente em horário comercial.
Minas Gerais tem 319 museus, 41 deles em Belo Horizonte. O horário de visitação reflete a realidade do país. No Brasil, 55,5% dos 3.025 acervos podem ser visitados aos sábados e apenas 43,1% aos domingos. Sergipe lidera o ranking nacional. No estado nordestino, mais de 70% desses espaços recebem turistas aos sábados.
Um exemplo negativo em Minas é o Memorial Minas Gerais Vale. Inaugurado com pompa e glamour em novembro de 2010, ocupa o antigo prédio da Secretaria da Fazenda e integra o Circuito Cultural Praça da Liberdade. Desde a estreia, porém, o local não abre aos sábados e domingos. A visitação se restringe a duas horas às quartas, quintas e sextas-feiras, mediante agendamento.
O curto período foi criticado pelos namorados Guilherme Bolina, 17 anos, e Isabella Vasconcelos, 18. Na última sexta-feira, os dois pretendiam conhecer o Memorial Minas Gerais Vale. Mas foram informados, na porta, que o passeio precisaria ser agendado. “Um dos funcionários me forneceu um panfleto com os horários. Sem opção, resolvemos ir até o Museu das Minas e do Metal”, disse o estudante.
O chileno Jorge Pënos, de 33 anos, também se sentiu prejudicado com o horário de visitação ao Memorial Vale. Em Belo Horizonte na semana passada, ele teve que se contentar com uma foto do museu. “É o que poderei mostrar aos meus amigos”, brincou o turista estrangeiro.
Além das restrições, a desorganização também atrapalha o funcionamento de alguns espaços, como o Museu Casa Guimarães Rosa, em Cordisburgo, na Região Central. Até a última sexta-feira, dia 1º de abril, o site da Secretaria de Estado da Cultura (www.cultura.mg.gov.br) informava que o local, dedicado à memória de João Guimarães Rosa (1908-1967), um dos mais importantes escritores brasileiros, não funciona aos sábados e domingos. No entanto, o acervo de aproximadamente 200 objetos pode ser visitado de terça a domingo, das 9 às 17 horas.
O professor Paulo Caldeira, que coordena o curso de Museologia da UFMG, classifica como “lastimável” o horário de funcionamento dos museus em Minas Gerais. “Infelizmente, isso tem sido recorrente, como no caso de praticamente todos fecharem as portas às segundas-feiras. É necessário um rodízio, ou os visitantes ficam sem opção”, disse.
A coordenadora geral de Sistemas de Informação Museal do Ibram, Rose Miranda, lembra que quase todos os museus (74,2%) são públicos. Para ela, o motivo para manter as portas dos espaços fechadas é a falta de estrutura. “Nos museus de pequeno porte, principalmente, são poucos funcionários e não há sistemas de segurança capazes de receber o público nos finais de semana”, avalia.
De acordo com a museóloga, essas mesmas dificuldades restringem o funcionamento ao horário comercial. Contribui para isso, segundo Rose, o peso das escolas na formação do público rotineiro dos museus. “Existe uma tendência, por parte dos colégios, de levar os estudantes até esses locais. Sempre foi assim. Em razão disso, os museus abrem, predominantemente, só de manhã e à tarde”, acrescentou, considerando que a maior parte dos alunos é matriculada no período diurno.
O presidente da Federação de Convention e Visitors Bureaux de Minas Gerais, Paulo César Boêchat, destaca a importância dos museus para o turismo no Estado. Para ele, é preciso uma ação de sensibilização dos gestores públicos. “O que acontece aqui é justamente o contrário do que é observado em outros países como Itália, França e Espanha. Na Europa e no restante do mundo, o maior fluxo de visitas acontece aos domingos e feriados”, compara Boêchat.
Pesquisa do Ibram expõe fragilidades e riscos dos acervos
A pesquisa do Ibram expõe a fragilidade da segurança dos espaços de memória em Minas. Nada menos do que 54,9% dos museus não contam com planos de segurança e emergência. Para piorar, parte do patrimônio cultural do Estado corre sério risco de virar cinza, já que em 67,6% dos museus faltam equipamentos necessários para o combate a incêndios.
Os casarões antigos com muitas peças de madeira , diz o assessor de comunicação do Corpo de Bombeiros, capitão Frederico Pascoal. Ele explica que a maioria dos museus funciona em casarões antigos com janelas, portas, tetos, pisos e forros de madeira, material altamente inflamável.
Além do risco de incêndio, outros agravantes são a falta de plano de combate ao pânico, existente em apenas 12% das instituições, e para a retirada de pessoas (21,6%) e obras de arte (12,2%).
De acordo com Pascoal, a legislação estadual prevê medidas de segurança, como combate a incêndios e pânico, em todas as edificações públicas. Segundo ele, o Corpo de Bombeiros faz, rotineiramente, vistorias nesses espaços. No entanto, o assessor não forneceu um balanço das notificações de irregularidades e das providências tomadas pelos gestores dos museus para saná-las.
O Estatuto dos Museus, sancionado em janeiro de 2009, prevê que todas as instituições do país tenham um plano museológico e de ações de segurança. Os museus que não cumprirem a determinação estão sujeitos a notificações, multas e até interdição.
Espaços do Circuito Cultural vão abrir à noite semanalmente
Os três espaços em funcionamento no Circuito Cultural Praça da Liberdade – Espaço TIM UFMG do Conhecimento, Museu das Minas e do Metal e Memorial Minas Gerais Vale – vão ter horários estendidos até a noite ao menos uma vez por semana ainda este ano. A visitação também será feita aos sábados e domingos no Minas Gerais Vale. São promessas da secretária de Estado de Cultura, Eliane Parreiras.
De acordo com a secretária, o Memorial tem recebido somente grupos pré-agendados e não abre aos fins de semana justamente porque ainda não está com funcionamento pleno. Segundo a secretária, a Superintendência de Museus e Artes Visuais, vinculada à Secretaria de Cultura, fez um mapeamento dos equipamentos culturais para classificar e apontar soluções para as carências percebidas.
Eliane Parreiras disse que esse diagnóstico precisa ser atualizado constantemente. “O Estado não gerencia estes espaços, mas o trabalho da Superintendência de Museus visa capacitar, mobilizar e sensibilizar as instituições para a importância da ampliação dos horários de funcionamento. Acredito que muitos museus já estudam como melhorar esse atendimento”.
No mês passado, o Circuito Praça da Liberdade completou um ano. Neste período, os espaços receberam um público diversificado em termos de faixa etárias e de origem. Em um ano, o Circuito registrou mais de 70 mil visitas. Os investimentos na criação desses espaços culturais foram milionários: R$ 13,6 milhões no Espaço TIM UFMG do Conhecimento; R$ 25 milhões no Museu das Minas e do Metal e R$ 23 milhões no Memorial Minas Gerais Vale.
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