Texto: Leonardo Pinheiro
Teve início no último dia 20 de outubro, o plantio dos vinhedos que povoarão a região e trarão a tona a tradição de produção de vinhos em Diamantina, conforme registra sua história, que também vem sendo resgatada.
Em sua colonização no século XVIII, ainda “Arraial do Tijuco” e maior produtor mundial de diamantes de sua época, imigraram para Diamantina diversas famílias europeias, que tradicionalmente tinham em sua base alimentar o alto consumo de vinhos. Devido à impossibilidade logística de se fazer chegar o produto à região, foram introduzidas as primeiras mudas viníferas na cidade, que também tinham o objetivo de abastecer os membros da corte e da igreja em seus ritos.
Consequentemente, já no início do século XX, a viticultura alcançou expressão econômica no município de Diamantina. Existiram diversos parreirais na sede municipal e nos distritos de Gouveia e Conselheiro Mata. A produção local de vinhos, tintos e brancos, rivalizou com a da cidade de Andradas, a maior produtora mineira, localizada no sul de MG. O governo do estado chegou a instalar em Diamantina uma Estação Experimental de Enologia, cujas atividades, todavia, não tiveram longa duração. A Igreja Católica e proprietários privados fabricaram vinhos artesanalmente, anunciavam seus produtos nos jornais da região e abasteciam o vasto território do Norte mineiro, empregando as tropas de burros para distribuir o vinho diamantinense. A crise de 1929 e medidas dos órgãos federais de saúde – que estipularam determinadas características para o vinho comercializado no país, como quantidade de açúcar e acidez – destruíram a viticultura e a vinicultura diamantinenses. Os produtores locais, sem maior capital para aprimoramento de suas lavouras (seleção e adaptação de novas variedades de uvas e melhorias nos processos de fabricação do vinho), além do ônus representado pela falta de crédito e infra-estrutura econômica na região, abandonaram o setor. Restaram, em algumas chácaras e quintais de Diamantina, apenas as parreiras que deliciaram familiares e vizinhos mais íntimos.
Foto do início do século XX com o Largo D. João e Seminário ao fundo, e com o casarão e seus vinhedos (note o sistema de condução). Neste loval hoje está situado a Superintendência de Ensino.
Desde a introdução das primeiras mudas de vitis em Diamantina, observou-se que as características da região (clima, relevo, solo, amplitude térmica, altitude, umidade do ar e regime de chuvas) eram extremamente favoráveis à cultura. Tais condições especiais proporcionaram frutos de qualidade inconfundível e sabores característicos próprios, um verdadeiro terroir* no alto Jequitinhonha.
Como analogia, assim como a cidade irmã vizinha do Serro produz queijos com propriedades intrínsecas próprias e inconfundíveis, Diamantina também foi brindada com características que a fazem ser capaz de produzir um vinho DOC** de qualidade.
Este é um dos objetivos do novo projeto da viticultura: produzir vinho de boutique, com conceito superior, ou melhor, artístico e com produção limitada, destinada ao fomento do enoturísmo.
"a verdade do vinho está na uva". Ou seja, é nela que tudo começa. E não é preciso se fazer quase nada na vinificação se a uva for bem tratada. "Evitamos manipulações, de forma a manter sua integridade, para que ela possa carregar consigo as peculiaridades da terra onde nasce, as características da variedade que a identifica e um pouco de cada uma daquelas pessoas que participaram de sua concepção" explica o enólogo Juliano Carraro da vinícola Carraro de Bento Gonçalves-RS.
Nesta primeira fase do projeto estão sendo implantados vinte módulos, utilizando as variedades Malbec, Merlot, Pinot Noir e Syrah, sendo todas as mudas de procedência certificada e devidamente adaptadas à região de Diamantina.
Vale salientar que todo o planejamento teve início ainda no ano de 2009, momento no qual o Polo de Inovação Tecnológica de Diamantina iniciava suas atividades, prospectando arranjos produtivos e cenários de potencial na região. Neste momento houve o primeiro contato entre a equipe do Polo e o proprietário da sítio Quinta D´Alva, Sr. João Francisco Meira, o qual por paixão e iniciativa própria, realizou em 2005, um plantio experimental com 9 variedades vitis europeias, objetivando selecionar aquelas mais apropriadas para a região (este importante trabalho inicial produziu conhecimentos que agora serão utilizados nos demais parreirais do Grupo Viticultor).
Imagem do vinhedo do Sítio Quinta D´Alva em Diamantina – vitis europeias plantadas em 2005
A equipe do Polo logo percebeu o potencial presente naquela iniciativa e deu início a montagem de um projeto inovador, sem precedentes e, junto a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior – SECTES, obteve recursos para sua execução. A proposta era criar um consórcio com 20 empreendedores, os quais receberiam, do Governo de MG, subsídio completo (mudas, sistema de condução, correção de solo e assistência técnica) para estabelecer 1000m2 de vitis em cada propriedade, e assim, assimilar as técnicas de manejo e constatar a viabilidade; em contrapartida, cada um dos empreendedores assumiriam, por contrato, o compromisso de expandir o vinhedo para 10.000m2 (1 hectare) em dois anos, dentro dos padrões estipulados pelo Grupo Viticultor. Seguindo esta lógica, já em 2013, o Grupo Viticultor terá uma área de plantio de 20 hectares, e em 2016, capacidade de produzir mais de 100.000 garrafas de vinho/ano, o que viabilizará a construção de da vinificadora do Grupo.
Após muitas reuniões para divulgar a lógica do Projeto e atrair possíveis interessados, finalizou-se a seleção dos primeiros 20 empreendedores, são eles:
Álvaro Palhares Diniz
Leonardo Pinheiro
Antônio Moreira Fernandes Neto
Madalena de Almeida Campos
Claudio Márcio Pereira de Sousa
Manoel Bueno Ribeiro
Daniel da Motta Barrote
Marcelo Araújo Caldeira
Demostenes José Coelho
Mateus Meira
Douglas Vale
Miguel Pontes Pontes
Francisco Pontes
Miriam D´Arc Rodrigues Martins
Gilson Fontoura Lima
Renato Eulálio
João Francisco Meira
Tarciso Santiago Junior
Leonardo Andrade
Vagner Vicente Ferreira
Posteriormente, realizou-se a preparação de solos e montagem dos sistemas de condução, tudo fundamental para ampliar as chances de sucesso. Em cada um dos 20 módulos, nesta primeira etapa, estão sendo plantadas 210 mudas de Syrah, 131 de Pinot Noir, 42 de Malbec e 42 mudas de Merlot, totalizando o plantio de quase 10mil mudas.
As fotos mostram o início dos plantios, em outubro de 2011, na Fazenda Altitude Máxima, no último 20 de outubro, a uma temperatura de 19 graus celsus.
Com mais um atributo positivo do Projeto, registra-se a exigência do cumprimento total das leis trabalhistas junto aos seus colaboradores, a exemplo dos funcionários da Altitude Máxima, os quais além de devidamente registrados com carteira assinada, foram também incentivados a ingressar no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Diamantina, o que abre portas ao processo de capacitação técnica, parcerias e benefícios assistenciais sociais diversos, extensivos também aos seus dependentes.
A filosofia deste Projeto está, desde sua concepção, fundamentada no desenvolvimento econômico sustentável e no bem estar social, com total respeito ao ser humano e ao meio ambiente.
Salienta-se mais uma vez que o projeto tem a parte inicial financiada pela Secretaria de Estado de Ciência, tecnologia e Ensino Superior - SECTES, com recursos da Fundação de Amparo a Pesquisa de MG - FAPEMIG, seguindo-se o aporte de recursos equivalente a 10% do total do Projeto. A previsão é de atingir na segunda etapa, vinte hectares de vinhedos, justificando a montagem da vinificadora privada do Grupo Viticultor. Serão 2 empregos diretos por hectare, mais 4 empregos indiretos também por hectare, já na segunda fase.
Outra meta do Grupo Viticultor é dotar Diamantina de uma rede de pousadas rurais, que ofereçam a modalidade mais demandada pelos turistas modernos: Enoturismo*** de alto nível. Além do vinho, tais propriedades estarão se preparando para oferecer atrativos complementares, tais como a produção de azeite, licores de frutas regionais, flores e muita paz.
O Projeto da Viticultura conta também com apoio e parceria da INOVALES - Agência de Desenvolvimento Regional, da ACID - Associação Comercial e Industrial de Diamantina e da UFVJM - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucurí.
* Terroir é um termo de origem francesa (lê-se terroar), provém do latim popular (terratorium) alterado no galo-romano (territorium; territoire). Significa originalmente uma extensão limitada de terra considerada do ponto de vista de suas aptidões agrícolas, particularmente à produção vitícola. Usa-se também a expressão produtos de terroir para designar um produto próprio de uma área limitada. O terroir, na ampliação do conceito desenvolvido por geógrafos franceses, é um conjunto de terras sob a ação de uma coletividade social congregada por relações familiares e culturais e por tradições de defesa comum e de solidariedade da exploração de seus produtos.
** Denominação de Origem Controlada, (DOC) é o sistema de denominação utilizado para certificar vinhos, queijos, manteigas e outros produtos agrícolas. Esta designação é atribuída a produtos produzidos em regiões geograficamente delimitadas, que cumprem um conjunto de regras consignadas em legislação própria, compulsória ou determinada pelo próprio Grupo Viticultor. Os vinhos certificados como DOC são produzidos em terroirsdelimitados, são sempre muito conceituados e satisfazem a normas de produção muito estritas, definidas pelo Grupo Viticultor produtor. Determina a tradição que eles estabeleçam os rendimentos, um grau mínimo de alcoolização e as condições de envelhecimento.
O DOC é o equivalente português do francês Appellation d'origine contrôlée - (AOC), do italiano Denominazione di origine controllata - (DOC), e do espanhol Denominación de Origen - (DO).
Em Minas Gerais, o Istituto Mineiro de Agropecuária – IMA, define que em primeiro lugar obtem-se o DG – Denominação Geográfica. Tão logo sejam estabelecidas propriedades legais que identifiquem o produto, pode-se obter o DOC.
*** Enoturismo - Turismo do Vinho - é um segmento da atividade turística que se baseia na viagem motivada pela apreciação do sabor e aroma dos vinhos e nas tradições e cultura da localidades que produzem esta bebida. Mais do que apenas "beber" vinho, o enoturista aprecia paisagens, utiliza os equipamentos de gastronomia, hotelaria e diversão, além de comércio local e outras prestações de serviço. O enoturismo deve envolver o visitante na cultura, nos detalhes da bebida: transforma em experiência de cinco sentidos. É o ver os vinhedos, ouvir as histórias, sentir o perfume dos vinhos, provar as delícias da gastronomia, tocar nas garrafas e texturas.
Além de conhecer a história, cultura e tradições do local, o turista tem a chance de ver o modo de elaboração dasviniculturas, com todas as etapas, entendendo o que compõe aquele produto.
Ressaltando que turismo se baseia numa viagem a lazer com mais de 24 horas e menos de 12 meses sendo que para ser considerado turismo a pessoa tem que contribuir para a economia do local.
No Brasil, não são só turistas, mas excursionistas e moradores que desfrutam das diferentes rotas de enoturismo. E começa a ser referência mundial pela qualidade e variedade dos serviços. No Rio Grande do Sul sãoi inúmeros atrativos. Vão do pampa à serra. A região da Campanha Gaúcha é uma das inovações, aliando paisagem, bioma preservado e vinhos de altíssima qualidade. Além do Vale dos Vinhedos, a Serra Gaúcha têm inúmeras opções como Rota dos Espumantes, Caminhos de Pedra, Pinto Bandeira, os vinhos de Flores da Cunha, Caxias do Sul. Vale também conhecer o Vale do Rio São Francisco (nordeste), região de São Roque (SP), serras capixabas (ES), além de toda região metropolitanda de Curitiba, grande consumidora e produtora de vinhos. As Serras Catarinenses também merecem destaque - combinar o frio com um grande vinho? Sensações inesquecíveis.
Boas!
ResponderExcluirgostaria de saber a quantas anda este projeto. Foi adiante?
Saudaçoes, do
Denir