Impossível menosprezar o papel do acaso no (frutífero) processo criativo do documentário A falta que me faz, que encerra nesta segunda (23/11) a mostra competitiva do 42º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
A cineasta Marília Rocha pesquisava o cotidiano de catadores de sempre-vivas na Serra do Espinhaço, no norte de Minas Gerais, quando conheceu quatro adolescentes que, inesperadamente, tomaram as rédeas da narrativa.
À procura de personagens, Marília acabou descobrindo um espelho nas experiências de Alessandra, Priscila, Shirlene e Valdênia. "Elas são pessoas muito fortes e frágeis ao mesmo tempo. Justamente por estarem vivendo um momento de transição, me atraíram muito. Elas estavam chegando aos 20 anos. E eu estava perto dos meus 30, também com várias questões sobre a vida", explica. Durante um inverno, a diretora de 31 anos acompanhou o fim da juventude de um grupo de jovens interioranas.
Moradoras da cidade de Curralinho, no distrito de Diamantina, as meninas vivem o drama dos sem-perspectivas. Criam fantasias impossíveis sobre os homens que vêm de fora, ouvem funk e forró, frequentam festas, namoram e negociam as cobranças da idade adulta. "O tema do filme se ampliou muito. Ele fala de incertezas que todos nós vivemos. As garotas criam relações de amizade, sofrem traições e perdas. São temas humanos", resume.
Paralelamente às mudanças vividas pelo quarteto, Marília também se deixou alterar: buscou um novo jeito de filmar. Abandonou muito da experimentação visual dos longasAboio, de 2005, e Acácio, de 2008, e mapeou o tema com apenas uma câmera digital. "A paisagem é linda, mas não há nada que chame atenção para a fotografia, por exemplo", afirma. Um documentário, por isso, sem compromissos com o convencional. "Participar de Brasília dá um friozinho na barriga, mas me tranquiliza o fato de ter um público interessado por cinema", diz.
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